segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Ser Um Deus



Calça jeans. Camiseta escura. Cabelo médio arrumado com as mãos, e logo estava pronto para sair.

— Os três habituais "C"s de sua vida, pensou, enquanto pegava a chave e colocava os fones de ouvido. Tinha mania de identificar padrões até em minúsculos detalhes: ter três amigos com a letra "M", ter estudado com duas pessoas cujos irmãos estudaram, juntamente, com o irmão dele. Ter um irmão com o nome começando com a letra "L", e ele, com a letra "M" — letras que aparecem em seguida no alfabeto  —, acontecendo o mesmo entre ele e seu amigo, Luan. Ter um colega chamado Kelvin, cuja irmã se chamava Kelly, e seus outros dois irmãos, respectivamente: Larissa e Lucas. Causando o mesmo padrão de letras sequentes no alfabeto: "L" e "M", "K" e "L", além das duplicatas; sem o consentimento dos pais.
Assim como aprendera a rimar e fazer poesias assimilando o padrão de sons que as palavras causavam. Melodias sonoras, aspectos físicos, símbolos, voz, personalidades, entrelaçamentos de histórias fictícias que acabara de ler com histórias reais do seu cotidiano, comportamentos irregulares de pessoas conhecidas identificáveis em uma simples palavra ou modo de dizer determinado assunto, em modo de se expressar e agir. Cores, placas de automóveis, frases e fotos lidas e registradas. Dificilmente algo escapava da sua analise e lembranças.

Seriam meras coincidências? Para o jovem calculista, era muito mais que obras do acaso. Uma coisa puxava a outra. Efeito dominó. Efeito borboleta: Uma parte da Antártica cai, um tsunami devasta a costa de um continente. Uma borboleta bate as asas, um furacão destrói uma ilha. Um pensamento aparece, uma história surge. Pequenos acontecimentos que se tornam gigantes ao longo do tempo. Afinal, quem adivinharia que uma pedra, ao cair no alto da montanha coberta de neve, desencadearia uma avalanche?

Sorte ou azar soa tão decepcionante. Estar fadado a um capricho da vida, a uma lei que pode defini-la. Não. Para ele, havia leis mais complexas e, divergente das opiniões quase unanimes da sociedade, compreensíveis. Sim. Porque se você entende como a vida funciona, significa que você tem a perspectiva de um Deus. Um ser que muitos nem se quer ousam falar o nome, outros, o temem pela sua força. Pessoas que o subestimam e que não acreditam em sua existência. Mas quem quer se tornar um Deus? Quem gostaria de entender como é a criação e o porque de tudo? Até mesmo a maior parte dos cientistas tem conhecimento suficiente para deduzir que nem tudo é lógico e tem explicação. Será mesmo que não tem? Olhando sempre pelo mesmo angulo, é claro que não. Só o lado material e a razão, ignorando o abstrato e a sensação. Aliando os dois é possível obter respostas que muitos pagariam para ter, porém, há um problema no processo. Se o conhecimento é adquirido através da emoção e da razão, significa, que só poderá aprender através dos dois. Você não pode simplesmente ler uma frase filosófica e aprender, a menos que tenha a experiência. Ou será que pode?

Uma coisa é você estar precisando de animação, e ouvir ou ler determinadas frases motivacionais. Outra, é você tornar-se naquelas letras, sentir a energia dela, não necessitando mais repeti-las, porque, agora, você é ela. Você é o exemplo, não algo ou alguém específico.

Saiu de casa e foi para aula de violão. Incrível como a vida se assemelhava a um filme ou desenho. Nas histórias fictícias, geralmente, nota-se uma aparência diferente dos protagonistas comparado as multidões, como se os escolhidos possuíssem em seu DNA a marca da mudança, do estranho, do anormal. Aqueles que pertencem a este círculo são capazes de encontrar outros como uma agulha em um palheiro. Pelo menos, assim era com o rapaz. Na sala de aula, simpatizava apenas com uma pessoa que nunca conversara. Sabia, de algum modo, que ela era igual a ele. Que havia alguma semelhança, muitas vezes, na dor que outrora tiveram.

Isso acontecia não só com as pessoas próximas. Ele podia sentir através do olhar, da voz, da aparência, como era a índole da pessoa, e, através dessa conexão, sabia que não teria dificuldades em conversar com elas. Isto porque, para a maioria das pessoas, ele era uma pessoa tímida. Porém, ele apenas não tinha assunto, como se necessitasse de um canal telepático para conseguir se comunicar e interagir como ele realmente é. E esse canal era difícil de encontrar, entretanto, ele sempre encontrava uma ou duas pessoas de semestre em semestre. E, dessa vez, não havia sido diferente. Dentre dezenas, assim que seus olhos encontraram ela, sabia que ela não era "normal". Pode soar ultrapassado, clássico como filme Star Wars, mas era verdade. Isso acontecia também com os cantores que ele ouvia. Ele se identificava com a voz, e depois percebia que o cantor teve situações e escrevia letras de traumas passados que ele havia vivido.

Tudo isso não podia ser uma simples coincidência.
Não mesmo.

"Deus está nas coincidências." - Nelson Rodriguez


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